terça-feira, 3 de junho de 2014

Rir de um palhaço



    Sabia que daquela maneira, não te conquistaria nunca. Seria muito difícil que te fizesse desviar o olhar, mesmo que eu te olhasse incessantemente, em busca daquilo que outrora foste. Se alguma vez me olhasses, mesmo que de relance, seria fruto da chacota dos outros e não da tua vontade de me contemplar. Do fundo das ciclópicas gargalhadas dos teus pares, olhaste-me, não nos olhos, mas superficialmente, como habitualmente se costuma olhar para um palhaço. E também te riste… mas não gargalhaste. O tempo parecia ter parado. Tirei uma flor da lapela e entreguei-ta. Tropecei, caí e desmoronei também o meu disfarce. Todos riram. Afinal eu era um palhaço e os palhaços têm que fazer rir, cair, desmontar as angústias dos outros e as culpas das crianças. Só não podem amar, que isso é coisa séria. Deixaste a flor em cima do banco. Também eu a deixei lá, porque não preciso dela para ser palhaço. Servia apenas para ser mais fácil amar, mas para ser palhaço, não é preciso nem flor, nem amor.

E.M. Valmonte


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