O homem de idade
movia-se com a dificuldade de quem ao mesmo tempo é elegante. Esperava-o o
banco de um jardim por trás do cemitério. Sempre o mesmo jardim. O mesmo banco
e por trás, sempre o mesmo cemitério. A distância entre o passado e o futuro
era ali muito curta, assim como acidentada. Se no mover rápido das damas, a
intercalada frescura mental o fazia relembrar a juventude, os muros altos do
cemitério como que se abriam, abraçando-o num gesto de bom anfitrião.
A sua mulher morrera de
cancro.
As saudades eram
suportadas pelo vento que lhe dificultava a leitura do jornal. Ainda ontem se
lembrou dela e chorou apenas de uma vista. Embora velho, não gosta de chorar em
público. Faz mal à humildade. Ele fora o primeiro a ficar viúvo e também por isso,
sabe melhor que os outros que a morte fica para além daqueles muros. Amanhã é
quinta-feira. É dia de visitar a campa da mulher e de lhe mudar as flores.
Costuma fazer isso pela manhã, pela fresca, porque o incomoda visitar o futuro
por livre e espontânea vontade. De tarde não joga damas porque está deprimido e
precisa de tempo para ficar sozinho. Nessa tarde prefere ouvir rádio e comprar
fruta.
As noites chegam sempre
com o tirar do chapéu. Talvez pela última vez. Era um chapéu parecido com
aquele que tinha quando conheceu a mulher. Comprou sempre iguais ou parecidos;
os chapéus conservam melhor as memórias. E este era um bom chapéu. Colocou-o no
bengaleiro onde sempre colocou as alegrias e as tristezas da vida.
Depois jantou, adormeceu
e acabou por morrer…
Morreram dias mais tarde
as flores da campa. Parece que choravam em silêncio, como sempre o fizeram.
Valmont
Admiro a beleza que consegues colocar nos momentos tristes.
ResponderEliminarMuito obrigado, caríssima S
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