Se eu fosse um
rapaz de verdade, tinha uma espada de madeira e defendia a única princesa do
reino. Tínhamos uma casa na árvore e uma escada de liamba. O vento batia-lhe
nos cabelos e trazia-me o cheiro a amêndoa. Ajudava-a a descer pelo tronco,
quando a mãe a chamava para o jantar. A espada de madeira, presa nas presilhas
das calças, dificultava a saída airosa do reino e sempre me deu um ar
atabalhoado ao entregar a princesa ao mundo dos crescidos. Ela, de vestidos de
abas largas, movia-se sempre como se voasse e cada dia que passava, por cada
dente frontal que me caía, mais se elevava o desejo e a vergonha de me tornar o
seu único rei, para todo o sempre.
Trocávamos o
lanche como os crescidos trocam o desejo de estar juntos. Afinal era amor, mesmo
que fosse em ponto pequeno. Afinal era amor…
Um dia, Jaime e
os restantes rapazes atacaram o nosso castelo. Desembainhei a espada, tirei a
flor da minha lapela, fechei-a na mão de Clara e corri, gritando como um herói
cheio de coragem. Estava disposto a matar e também por isso, sabia que podia
morrer.
Lutei como nunca
o fizera antes. Clara tropeçara a fugir e partira o braço. Defendera-a, como se
defende a vergonha do dia seguinte. Talvez por isso, tenha sido eu o primeiro a
escrever-lhe no gesso do braço. “Uma espada de madeira, também defende um reino”. Clara abriu a mão, devolvendo-me a flor à lapela.
E.M Valmonte
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