quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Mesmo que eu

Para onde foste?
para nascer
precisas de uma mãe
essa indómita  arrogância
pensares que consegues nascer sozinho
sem mãe
sem pai
mesmo que não precises de aconchego
ou que eu te diga boa noite
foi por felicidade
que te imaginei
que te desenhei
eu não queria crescer por ti
mesmo que não me quisesses dar a mão
nos primeiros passos
mesmo não querendo que o meu lenço
te enxugasse as primeiras lágrimas
mesmo que eu assistisse de longe
não precisavas de partir
nem de infligir tanta dor
faz doer
não te ver crescer
para onde foste?
nem sequer me disseste
de que cor querias que te pintasse o quarto.
efrem miranda

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Rastejar no restolho



acontece sempre de manhã…
ainda nem o orvalho acordou
já a avó perfuma os sentidos
trinados pelos acordes garridos

…de um galo que se quis perneta

uma estria de trigo
ao canto musculado da boca
a bússola desnorteada de um campo
de cotovelos surrados no tampo

…da velha mesa serrada no pé

o carvão do lápis suja-me a memória
o papel pardo, debota vivências
embrulha-se nele o amor de um homem
é apenas um coração que bate
num corpo
podia ser o manto
no dorso de um cão vadio

…a quem lhe tinham partido uma perna

do outro lado da inocência
eis que se vislumbra o campanário
aguardam no confessionário
os militantes segredos imaginários

…a um padre que ficara coxo na guerra

um último olhar agendado
antes do carinhoso copo de leite
calma a noite se vai deitando
uma brisa de vez em quando


…balanceia uma flor sem caule

para onde vai a sombra
do empedrado?
aquela que se vê do terraço
manchas campónias suam da terra
sujam de pó as mortes da única guerra

…onde não se entoam os canhões.



efrem miranda

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Trago-te

se não vens
então
eu nunca mais volto

se vieres
voltarei mais tarde

levo-te sem saber se voltas