sábado, 3 de outubro de 2015

Abstenho-me de morrer enquanto a vejo cair

Do meu quarto, vejo uma árvore com folhas. Em dias de reflexão, sento-me no cadeirão de mogno, fixo-me numa folha e tudo o que faço é esperar que ela caia. Pode demorar dias, como costumam demorar as minhas indecisões. Não tenham pena de mim. Nestes momentos não há aflições, repercussões ou abnegações. Não me nego e não elejo ninguém. Espero apenas que a folha caia. Espero apenas que ela não se magoe, de tanto eu achar que ela não serve para mais do que varrê-la para um caixote. Como se fosse ela a higienização deste crepúsculo que eu absorvo, quando olho para dentro da vida ou para fora de mim.


Tenho assistido ao desfalecimento gradual da minha vida e também ao das folhas de uma antiga nespereira, que invejo do meu cadeirão de mogno, sempre que preciso de escolher um caminho. As garrafas de vinho absorvem as más escolhas e tornam todos caminhos mais belos e as folhas de nespereira mais perenes.

nuno mc

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