sábado, 13 de abril de 2013

Encontrou o que sempre desejou


Estava sol. Um belo dia para os comerciantes, principalmente para um comerciante que inaugurava naquele mesmo dia a sua loja. Os sinos da igreja marcavam o compasso do início da manhã. A pequena população da aldeia, espreitava como as crianças espreitam para uma vitrina de bolos e as primeiras sensações de inquietude roliçavam, primeiro nas mulheres, enquanto os homens escondiam o temor, enchendo o peito de confiança.
Pelo menos naquela plateia, parecia que todos tinham medo, de ter medo.

À hora marcada, a nova loja da aldeia abria as suas portas como prometido, mas ninguém entrou, nem mesmo os tais homens debutantes de coragem. Ninguém entrou, nas duas semanas seguintes, a não ser um homem, que nada tinha de diferente de todos os outros homens, à excepção de não ver. Não via desde os sete anos, quando a mãe involuntariamente lhe derramou óleo a ferver sobre os olhos. Nunca mais viu e também nunca mais amou. No dia em que soube que nunca mais conseguiria ver, perdoou a mãe acariciando-lhe a face procurando o local perfeito para a beijar. A mãe, não se perdoou e matou-se, cegando-se primeiro, antes de se enforcar na capela da aldeia.
Foi este homem, sedento de vista e de amor, o primeiro freguês daquela loja que Deus decidiu não abençoar desde o início. O destino protege os seus filhos. Este homem preferia não ouvir, pelo menos os tamborilares dos sinos da igreja. Foi naquele maldito campanário que a sua mãe liquidou todas as suas dívidas de consciência.

Já dentro da loja, encontrou o que sempre desejou...


e.m.


1 comentário: