sexta-feira, 28 de abril de 2017

a passar em rodapé

A noite está escura. Gosto de vir para aqui, nas noites escuras, ver as vidas a serem vividas. Não vi o gato que me vigiava e este encrespou-se assim que me aproximei. Acalmei-o com um pedaço de pão que se esfarelava no bolso, depois sentei-me e ele sentou-se a meu lado, como que reconhecendo que este observatório de vidas improvisado era suficientemente grande para dois voyeurs nocturnos.
O filho da dona Arlinda fuma às escondidas na marquise, o Serguei por vezes embebeda-se e bate na mulher que é cabeleireira e precisa da vista. Quando não está bêbado é um amor, gosta de ajudar o sr. Fernando a cuidar do jardim e de enamorar a Corália da mercearia. A filha do Serguei é bastante nova, demasiado nova para fugir pela escada de incêndio para ir fumar e fazer outras coisas começadas com efe, com o filho da dona Arlinda. Eu e um gato preto, gozamos a noite e comemos migalhas de pão, enquanto vemos as vidas deles a passarem em rodapé pelas nossas. 

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